Novos Textos

Texto #1
Diálogo no. 10
A imanência divina que se sente de semelhante a semelhante em determinadas circunstâncias
Necessidade de compreender melhor o valor dos afetos humanos
González Pecotche

Feliciano: Chamam-me sempre a atenção essas cenas singulares, próprias das despedidas motivadas por uma longa viagem, partidas para a guerra, separações irreparáveis, etc. Naturalmente, tenho procurado explicar essas circunstâncias que assumem em certas ocasiões contornos dilacerantes, com a reflexão de que, em tais momentos – viagens a terras distantes ou idas à guerra – teme-se  não ver mais a quem se afasta e, reciprocamente, a quem fica, sentimento este que aparece como um augúrio triste, enchendo de lágrimas os olhos e inundando o coração de pena.  Quanto às separações irreparáveis – casos de morte –, explico-as pelo vazio que deixam em nossa vida e pela dor que ocasionam semelhantes perdas. Apesar disso, presumo que exista por trás desses fatos um enigma no qual não consigo penetrar.

Preceptor: Pronuncia-se nos protagonistas destas cenas, com efeito, uma impressão de indescritível força evocativa que comove suas fibras mais profundas. Nesses momentos, precisamente, é quando cada ser humano tem a sensação de experimentar o desprendimento de algo que antes – quando  formava parte de sua vida, digamos – nunca havia sido valorizado como no momento da separação, em que é avaliado no mais alto grau. Nesse amargo transe é, pois, quando o ser é transtornado pelo rigor de uma realidade a que antes permanecia insensível. Essa realidade representa o completo esquecimento, a indiferença ou a monotonia em que havíamos incorrido com respeito a seres estreitamente vinculados a nós, experimentando e exteriorizando nesses breves momentos da vida, muitas vezes excepcionais, a intensidade de um afeto que mantivemos silenciado dentro de nós. Essa realidade pareceria assinalar-nos, também, os valores e virtudes que não soubemos apreciar na pessoa amada, passando por nossa mente a imagem do quanto deveríamos ter feito para que esse amor ou esse carinho professado tivessem feito mais feliz a criatura da qual nos separamos. Na verdade, sente-se em tais casos, de semelhante a semelhante, a imanência do divino. Desfilam ali, ao conjuro de mil recordações, as horas felizes ou infelizes vividas em comum, bem como os afetos e cuidados mutuamente prodigalizados e esquecidos com tanta freqüência.
Tudo isso se acentua até o paroxismo nas separações definitivas. Durante esses instantes, tão solenes para a alma humana, pensa-se sempre o melhor possível do que foi e fez em vida aquele que partiu, perdoando-lhe piedosamente os erros. Para reter o ser querido, o que não se daria nesses momentos!
Não obstante, esse fato constitui uma das grandes experiências que, reproduzida através dos séculos, a humanidade ainda não compreendeu. E não compreendeu porque nunca lhe ocorreu pensar que, além do fato em si, ela entranhava um ensinamento que todos os seres deviam captar.
Feliciano: A explicação dada muito me satisfaz porque descobre à minha inteligência um detalhe de inestimável valor: a magnitude do conceito que nos merece o ser querido nesses instantes supremos. Porém ainda fica por entender em que consiste o ensinamento mencionado, pois estimo que já deveríamos corresponder ao mesmo com nossa compreensão.
Preceptor: O ensinamento descobre-se, de fato, se se pensa que, na quase totalidade dos casos, os seres unidos por afetos familiares ou por vínculos de amizade, raramente se prodigalizam o sentimento de estima tal como corresponderia, evidentemente, conforme a qualidade do vínculo de união. Esse afeto ou estima acentua-se às vezes por razões excepcionais enfermidades, tristezas, prazeres, etc. – mas, com bastante freqüência, promovem-se distanciamentos produzidos pela intemperança, desentendimentos e desavenças, tão comuns na vida familiar. Como se concilia, pois, a exaltação do sentir no instante das separações com a quase indiferença demonstrada antes do acontecimento?
O ensinamento salta agora bem claro ao entendimento: pensemos que em qualquer momento pode-se produzir essa classe de separações e comportemo-nos como se na verdade fossem ocorrer, isto é, evitando as intemperanças, os desentendimentos e as desavenças com o ser querido, e procurando, em troca, que nossa companhia lhe seja sempre grata. Atenuemos suas faltas e propiciemos nele os mesmos propósitos e sentimentos.
Se o transe penoso chegar a produzir-se, sentir-nos-emos mais reconfortados pensando haver sido, em todo momento, conseqüentes com o afeto que por ele sentimos. Isto evitará arrependimentos tardios, que nada remediam. Quando este ensinamento for compreendido e alentar a vida de quem o realize, haverá, seguramente, mais bondade nos corações humanos.
Feliciano: Penso da mesma forma, sem a menor sombra de dúvida.
Preceptor: Por isso insisto, e insistirei sempre, que se compreenda o grande ensinamento surgido desses fatos: se a realidade de supremos instantes tem-nos demonstrado a existência em nós de possibilidades que haviam permanecido estáticas, comportemo-nos conforme nosso sentir e pensar, sem faltar com o saudável e benéfico ato comunicativo que a alma tanto agradece e tão grato se torna aos que formam o círculo de nossos afetos. Mas isto somente se poderá conseguir, na mais ampla medida, se diariamente pensarmos que nós ou eles, nossos seres queridos, haveremos de partir instantes depois, talvez para não nos vermos mais.
Quão mais felizes haverão de ser as horas de nossas vidas se, adotando tal conduta, deixarmos de ser cruéis com nossos afetos, e, com delicadeza de espírito e expressões discretas de nosso sentir, os prodigalizamos, hoje e sempre, sem essas restrições que antes impuseram as reservas do caráter.


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                      Texto #2

Noções elementares sobre a mente

Como você define a palavra “mente”?
Já pensou alguma vez nisso?
A mente viria a ser o espaço onde atuam os pensamentos; é como se disséssemos: a casa onde eles entram, se movem, de onde saem, onde se hospedam e, também, onde nascem ao calor de fecundas concepções.
Esta definição, tão simples quanto profunda, é imprescindível para compreender fatos e situações da vida aparentemente inexplicáveis ou não definidos, nem esclarecidos com precisão.
Convém saber que os pensamentos, à semelhança do que ocorre com as pessoas, têm atuações próprias. Podem chegar à mente de um homem e exercer ali uma determinada influência. Consideraremos, por exemplo, o caso de um indivíduo de escassa cultura em cuja mente surja um pensamento que leva em si a inclinação ao roubo. Esse pensamento começa a atuar dentro de sua mente e, ao final de um breve tempo, faz com que o homem por ele perseguido pratique o ato que a intenção do roubo sugere.
Você sabe como atuam os pensamentos?
O que acabamos de dizer basta para revelar a grande necessidade que existe de conhecer essa atividade. Os aspectos que em seguida adicionaremos demonstrarão ao leitor que essa necessidade é realmente imperiosa.
Os pensamentos vivem, se movem e agem, passando de uma mente para outra com enorme facilidade, em busca de pontos de afinidade. Dentro de cada mente podem ir se alternando os mais variados pensamentos, sem que o homem suspeite da presença de tais hóspedes, os quais ele confunde com elementos próprios e originais de sua mente.
Nos momentos em que um grande número de pessoas padece de pré ocupações afins, os pensamentos, quando por sua natureza se multiplicam, dão lugar à formação de um ambiente coletivo, seja de ansiedade, seja de temor, etc., que pressiona a todos os que participam do dito ambiente, diminuindo-lhe as energias necessárias para superar a situação ou transformando-o, por contágio, em atitudes bélicas, etc.
Daí a enorme importância que tem o conhecimento de como atuam os pensamentos; é o primeiro passo que devemos dar para aprender a nos esquivar da perigosa influência do verdadeiro “contágio mental” que acabamos de descrever.
Saber como deve o homem selecionar os pensamentos para viver exclusivamente com aqueles que o beneficiam, porque lhe são úteis, proporcionando-lhe motivos de satisfação espiritual e moral, eis a obra mais elevada a que podemos nos consagrar.
(Fonte: Coleção da Revista Logosofia, Vol. III, p. 31)


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Texto # 3
O conceito de felicidade
Texto # 3 – O conceito de felicidade

 “A felicidade é algo que a vida nos outorga através de pequenas porções de bem. Comumente é buscada com os olhos postos em um só ponto; se esse ponto fracassa, se esse objetivo desaparece, a vida se retrai, sobrevindo a dor, o ceticismo, a decepção.
Se você focaliza ativamente o olhar sobre muitos pontos, procurando ao mesmo tempo aproximar-se por esse meio da felicidade, chegará a imunizar-se contra esses efeitos depressivos, dissipando os transes amargos ou fazendo-os suportáveis, pois atuarão em seu favor as defesas criadas por todas as pequenas porções de felicidade que tenha conseguido reunir. Por outra parte, pense que, se em alguns desses pontos o fracasso o surpreende, em outros pode esperá-lo o êxito.
Pois bem; a felicidade adoça a vida, enchendo-a de esperança e de graça; se, porém, a consciência permanece estranha a ela, sua presença no sentir será fugaz, e a recordação do bem que nos proporcionou se esfumará rapidamente.
A felicidade murcha como as flores; entretanto, assim como o bom jardineiro sempre tem a seu alcance outras para substituí-las, quem possui conhecimentos pode, também, substituir constantemente os motivos que dão permanência à felicidade na vida. O conhecimento a fixa, a torna estável; permite sentir seu palpitar de eternidade.
Você compreenderá agora que a felicidade não é o que se desfruta em um, em dois, nem em três instantes, enquanto se sente esse algo que nos atrai e que nos faz ditosos. Ela deve interpenetrar* todo o nosso ser. A gente deve senti-la como a própria vida. Só então poderá o homem dizer que a conhece; e isso acontece quando, diante desse imenso horizonte de possibilidades que o conhecimento abre à sua vista, ele descobre dentro de si uma capacidade maior para realizar seus anelos de bem.
Somente o conhecimento superior pode pôr o homem em contato com essas pequenas porções de felicidade que a vida lhe oferece; e, uma vez conseguidas, já não as poderá perder, pois se haverão integrado a sua vida..” (Fonte: C. B. Gonzalez Pecotche, “Bases para sua conduta”, p. 43-44)


Texto # 4 - Em torno da meta ideal

(Palavras iniciais de uma aula de Gonzalez Pecotche, publicado no livro "Introdução ao Conhecimento Logosófico - p. 217) 


Cada ser humano caminha pela vida atrás de uma meta ideal; ideal porque as idéias, logicamente, são as que consti­tuem, ou constróem, melhor dizendo, a ponte que une o mun­do físico com o da ideação. Quem vive sem um ideal carrega a morte sobre os ombros.
O ideal é aquilo que cada um forja como estímulo pode­roso para conquistar o que se propõe. Se esse ideal é superior, o espírito ascenderá à medida que o ser avance para as metas superiores que lhe assinala o próprio ideal; se é inferior, seus passos se encaminharão para metas inferiores. Quando o ideal é superior, o homem luta, se empenha e se sacrifica para con­quistar, dia após dia, uma parte do ideal forjado, e se este abarca sua própria vida e ainda muito do que o rodeia, a lei lhe exige não descuidar nem uma só partícula do que está com­preendido nele. Poderá, eventualmente, retardar a atenção que esse ideal requer, mas nunca esquecê-lo e, menos ainda de­preciá-lo.
Enquanto se desenvolve o processo traçado por um ideal superior, se apresentam ao homem múltiplas ocasiões para efe­tuar observações de importância. As experiências constituem, talvez, o maior valor, e quem não se detém frente a elas, pre­sentes ou passadas, para extrair as conclusões que irá aplicar em suas atuações futuras, de fato detém ou atrasa sua evolução.